Maternidade e carreira na pós em Contabilidade, o que muda na vida das docentes
"A maternidade costuma ser tratada como escolha privada, mas um estudo recente chama atenção para o quanto ela repercute no trabalho acadêmico em Contabilidade no Brasil. Publicado na revista Contextus, por Silvana Dalmutt Kruger, Edicreia Andrade dos Santos e Cristina Hillen, o artigo analisa como professoras de programas de pós-graduação em Contabilidade lidam com a chegada dos filhos e com a expectativa de produtividade que marca a vida universitária.
A pesquisa seguiu caminho qualitativo, com entrevistas semiestruturadas e análise textual discursiva, apoiada no construcionismo social. Foram ouvidas nove docentes permanentes de nove programas diferentes, de várias regiões do país. Seis já eram mães e três ainda não tinham filhos, mas trouxeram o tema como plano próximo. As entrevistas ocorreram em outubro e novembro de 2022, por chamada online, com participantes que tinham em média 37 anos, cerca de seis anos de docência na graduação e cinco anos na pós-graduação.
Nos depoimentos, a maternidade apareceu ligada a uma sobrecarga contínua. As professoras relataram acúmulo de ensino, pesquisa, orientação e tarefas administrativas, somado aos cuidados com filhos e casa. A divisão dessas rotinas com parceiros foi descrita como limitada em muitos casos, o que reduz o tempo livre e aumenta o cansaço mental. Esse cenário se conecta à ideia de work life balance discutida no texto, mostrando que o ajuste diário não é simples e costuma exigir escolhas difíceis.
Outro ponto forte do artigo é a percepção de desigualdade no ambiente acadêmico. As entrevistadas relataram sentir que a maternidade é vista por colegas como fase de menor entrega, gerando comentários e julgamentos que afetam o clima de trabalho. Algumas disseram ter ouvido críticas vindas até de outras mulheres sem filhos, o que reforça a pressão por manter um ritmo de produção que pouco conversa com o tempo da maternidade.
Quando o tema é progressão na carreira, os relatos mostram conflito permanente de expectativas. Muitas descreveram culpa por não atender ao mesmo tempo o que imaginam ser uma boa mãe e uma boa professora. A volta após a licença apareceu marcada por cobranças de prazos e publicações, sem grande adaptação das exigências institucionais ao novo cotidiano familiar. Em alguns casos, a maternidade foi adiada ou planejada visando momentos menos críticos da trajetória acadêmica, sinal de que o sistema incentiva cálculos pessoais sobre tempo e risco.
O estudo sugere que ampliar a presença feminina na pós passa por discutir critérios de avaliação, distribuição de tarefas e formas reais de apoio, indo além do discurso formal. A ideia central é simples: sem mudanças na cultura acadêmica, a maternidade tende a seguir como fator de desigualdade, afetando permanência, bem estar e oportunidades de progressão."
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